Casa

Mantive o meu olhar fixo no seu e assenti com a cabeça - Eu sei mas tens de fazer um esforço. Tens de sair daqui e pensa na consulta sim? Vais lá uma vez e se não servir para nada não tens de voltar. - aquilo podia ser um grande tiro no escuro mas mais valia tentar alguma coisa e quem sabe se não resultaria - Já tens tanto com que te preocupares, não te preocupes comigo. - larguei as mãos dele e empurrei-o com um sorriso depois de me beijar a testa - Sai daqui. Vai dar uma volta. Podes estar sozinho na mesma mas fora daqui. Precisas disso.

Assenti, não gostando muito da ideia de ir a uma consulta com um psicólogo ou psiquiatra ou coisa do género. Só queria que isto se resolvesse rápido, já se andava a prolongar há muito tempo, e eles só me iam complicar a vida. Mas ela estava praticamente a implorar-me, e eu sabia que não ia desistir da ideia. - Está bem. Eu vou marcar. - Garanti.
Abri a boca falar e contrariá-la, quando ela me afastou. Revirei os olhos, desviando o olhar para a rua por baixo de nós. - Eu vou. - Suspirei. - E tu precisas de parar de mudar de assunto sempre que eu tento falar de ti. Eu estou atento, Liv. - Esfreguei-lhe o cabelo, já a saber que ela odiava, e sorri. - Descansa.

Sorri com a confirmação dele de que iria marcar uma consulta; poderia não dar em nada mas já era um passo e com alguma sorte aquilo iria ajuda-lo a lidar com os problemas. Revirei os olhos e bati-lhe na mão que ele levou ao meu cabelo e encolhi os ombros - Não te preocupes comigo, preocupa-te contigo. - repeti levantando-me - Eu vou dar uma volta também. - disse com um encolher de ombros enquanto ponderava se devia ou não mandar uma mensagem ao Aaron - Mas se precisares de alguma coisa liga e eu vou a correr. - assegurei-o e ele sabia que eu o faria mesmo.

Sorri, satisfeito, quando ele me agradeceu, e segui atrás dele até à rua, onde tivemos que esperar pelo táxi que ele já tinha chamado. - Eu gosto dela. - Assenti, sentia um aperto do peito, por causa da sensação de mal estar, mas não consegui deixar de sorrir, porque a verdade era que, gostar de Olivia, era estranho e agradável. - Ela deixa-me inspirado. - Felizmente não tivemos que esperar muito pelo táxi, que já o via ao longe. - Mas, eu não sei... - Encolhi os ombros, ele sabia que fazer amigos não era o meu forte. Tinha-me tornado demasiado desconfiado depois dos pontapés que já tinha levado.

-Vou sempre preocupar-me contigo. - Revirei os olhos, ela já devia saber.
Abri a boca para lhe perguntar se ela me dava boleia até ao cemitério, mas acabei por me calar. Acho que, quando ela me dizia que eu precisava de sair, não era para aí que me imaginava a ir. - Está bem, eu levo o meu telemóvel.Até logo. - Agarrei no meu telemóvel perdido no sofá e sorri a Liv, antes de ir até ao quarto, vestir uma roupa que fosse digna e decente para andar na rua.

- Eu sei que sim mas preocupa-te menos comigo e mais contigo. - disse dando-lhe uma palmada no rabo antes de ele se afastar da nossa pequena varanda para o interior da casa - Diverte-te! - disse-lhe num tom mais alto para ele me conseguir ouvir. Olhei para o meu telemovel e abri a página da Internet à procura de algo interessante para mandar uma mensagem ao Aaron a seguir.

É impossível não pensar, resmunguei mentalmente com o meu irmão, enquanto saía de casa e apanhava o táxi que já tinha chamado. Já conhecia o senhor e ele conhecia-me a mim, pelo que não tinha medo de ser raptado ou de ter um acidente, porque o homem era de confiança.
A casa de Olivia não ficava perto, mas não demorava muito de carro, pelo que, quando vi ao longe, mandei-lhe mensagem que estava a chegar, sorrindo satisfeito por ser 16:58h e estar dentro da hora.

Levantei-me do sofá ao ver a mensagem do Aaron e caminhei até à porta, abrindo a mesma - Olá. - cumprimentei com um sorriso ao vê-lo do lado de fora - Vamos ou queres entrar? - perguntei guardando o telemóvel no bolso das calças - Queres comer ou beber alguma coisa antes de irmos?

Juntei as sobrancelhas ao ver que eram cinco da tarde e ela não me tinha respondido, mas logo suspirei de alívio ao vê-la abrir a porta da rua. - Não, eu não quero entrar. - Estava demasiado entusiasmado para parar e comer alguma coisa, antes de irmos. - Quero ir já. - Sorri, começando a andar atrás de si, sabendo que ela tinha carro - felizmente, porque eu odiava transportes públicos. - Gostas de museus ou só queres ir ver porque... "estavas à seca"?

- Vamos então. - disse agarrando na minha mala onde coloquei as chaves de casa depois de fechar a porta. Tirei as chaves do carro de lá porque apesar de o museu não ficar muito longe, não ia a pé com aquele calor - Depende dos museus. - respondi sinceramente com um encolher de ombros - Mas estava a ver planos na internet quando vi o museu e não sei, achei que ias gostar.

Sentei-me no banco ao lado do do condutor, assim que ela destrancou o carro, e assenti à sua resposta. - Eu vou adorar! - Sorri, ligeiramente entusiasmado demais. - Eu adoro arte, sou um artista... ou pelo menos é como me chamavam no hospital. Eu pinto e faço retratos, eu fiz vá-- - impedi-me de falar, percebendo que estava a começar a esbanjar palavras, principalmente, a esbanjar informação a mais para ela. - Desculpa.

Soltei uma gargalhada ao ver o entusiasmo mais do que visível do Aaron com a nossa ida ao museu. Assenti com a cabeça quando ele disse que adorava ir a museus porque era um artista e lembrei-me do desenho que ele tinha feito de mim lá no hospital - É verdade, és um artista e dos bons. - disse sinceramente. Ou pelo menos aquele desenho que ele me tinha dado estava muito bom, com bastantes pormenores e muito bem feito. Apesar de eu estar longe de ser uma entedida de artes - Não peças desculpa, podes falar à vontade. - dei a volta à chave e conduzi em direção ao museu.

Sorri, esfregando as minhas mãos uma nas outras enquanto fitava as ruas a passar por nós, com cores que eu adorava absorver. - Eu tento. Os meus pais querem que eu continue a estudar e que arranje um emprego fixo e estável, porque é melhor para mim, mas na verdade é melhor para eles, e eu não quero. Quero continuar a pintar. - Assenti, decidido. - O que é que tu gostas de fazer? - Perguntei, lembrando de quando ela me disse que era modelo.

Já havia algum trânsito na cidade uma vez que àquela hora a maioria já estava a sair dos empregos e a ir para casa por isso a viagem foi mais demorada do que tinha imaginado. Assenti com a cabeça enquanto ouvia a sua explicação - Fazes muito bem. Se é isso que gostas e que queres fazer, não interessa o que eles dizem. - mordi o lábio inferior enquanto pensava numa resposta à sua pergunta - Hmm. Gosto de cantar. No chuveiro. - acrescentei - Gosto de animais. Bem acho que era capaz de me safar como babysitter de animais de estimação. - brinquei.

Bati com os dedos junto da porta, à espera de chegar ao museu, mas o trânsito parecia não querer ajudar-me a chegar rápido ao destino.
-Os animais não-- - calei-me, percebendo pelo seu sorriso que estava a brincar, e acabei por me rir. Fitei-a por mais dois segundos que o normal, sorrindo ligeiramente ao absorver mais das suas expressões faciais e dos seus traços. - Fiquei feliz por teres falado comigo, Olivia. - Admiti. - És divertida.

Olhei para ele quando começou uma frase mas a interrompeu e sorri ao ouvi-lo rir. Não me lembrava de já o ter visto a rir. Acho que era a primeira vez que ele o fazia à minha frente. O meu sorriso alargou-se ainda mais com o que ele disse a seguir - Obrigada. - respondi ainda bastante sorridente - E eu também estou feliz por ter falado contigo. O que disse na noutra noite era verdade. - disse-lhe referindo ao facto de gostar dele e de passar tempo com ele - Chegámos. - com bastante sorte tinha conseguido arranjar um lugar bastante perto da entrada do museu.

Quando cheguei a casa de Axel, que agora também era minha, tinha-me enfiado no quarto e poucas vezes tinha de lá saído. O meu irmão andava ocupado e cansado e ela não tinha dito nada, mas também não tinha esperado outra coisa, não me admirava se ela nunca mais me falasse, apesar de, por vezes, me perguntar o porquê de estar a demorar. Sorri, fitando os meus dedos que brincavam uns com os outros. - A minha mãe costumava dizer que só as pessoas especiais iam gostar de passar tempo comigo. - Comecei. - E que as pessoas especiais eram poucas ou nenhumas, mas acho que te encaixas nessas pessoas. - Sorri, saltando para o chão assim que chegámos, porque tudo o que eu queria era entrar.

- Eu nem sequer fui rude! Até ando a ser simpático demais. - constatei uma coisa que era bastante verdade. Sai depois do carro, fechei a porta e contornei o mesmo até chegar ao outro lado, onde o Ben estava. - Deves pensar que mandas. - puxei-o mais para fora do carro, com cuidado para ele não começar a chamar-me rude ou coisas do género e fechei depois a porta.

Não ouvi nada do que ele disse, o meu cérebro ainda parecia estar a meio de um sonho, mesmo que eu me quisesse concentrar nas suas palavras era complicado percebê-las. - Shh - mandei baixinho, deixando-me encostar ao seu braço para não cair, já que só tinha um dos olhos meio abertos para ter a certeza de que não ia contra uma parede. - Não quero dormir sozinho, ficas comigo um bocado? - A minha sorte era que eu não tinha medo de perguntar nada quando estava mais a dormir do que acordada.

Apenas revirei os olhos quando ele me mandou calar e segurei-o para que não caísse ao chão, já que era algo que não me admirava nada se acabasse por acontecer visto que ele continuava meio a dormir. - Sim, eu fico. - respondi apenas encolhendo em seguida os meus ombros de forma leve. Depois de trancar o carro comecei a caminhar com o Ben, devagar, para a porta da casa, parando em frente da mesma. - A chave? - perguntei-lhe.

Tivemos que subir um lanço de escadas já que eu, mesmo meio a dormir, não conseguia entrar em elevadores. Apertei o livro que estava encostado ao meu peito e quando parámos percebi que estava à porta de casa. Afastei-me ligeiramente de Axel, tentando enfiar a chave na porta, e só depois de muito esforço é que consegui abri-la. Suspirei, cansado, e ainda tive forças para olhar para a sala, à procura da minha irmã, mas não a encontrei. - Anda, vais... - abanei a cabeça, procurando o meu quarto - embalar-me. - Não consegui evitar rir.

Fiquei à espera que ele abrisse a porta e assim que o fez entramos na sua casa que estava bastante silenciosa. A Olivia ainda devia estar com o Aaron. Empurrei a porta fazendo a mesma fechar-se e mordi o meu lábio para não me rir ao ouvi-lo. - Até com sono te tentas aproveitar de mim. - gozei com ele e puxei-o para o sítio certo em direção ao seu quarto, já que ele parecia estar meio perdido. Mas eu ainda me lembrava onde era, por isso levei-o até lá, abri a porta deixando-o depois entrar na divisão.

Saí do táxi assim que o mesmo parou à entrada do prédio e não disse nada enquanto o Aaron pagava o mesmo mas apenas porque naquele momento não tinha força para discutir. Mais tarde voltaria a convidá-lo para sair - e desta vez não me esqueceria de tomar ou levar algo para tomar caso isto se repetisse - e ia compensá-lo por tudo o que tinha passado e pagado comigo - Oh desculpa. Sim, claro que podes. - respondi enquanto procurava as chaves de casa para abrir a porta já que não sabia se o Ben estava em casa ou não.

Sorri pela sua resposta, mas parei a meio, focando o meu olhar no carro acima do seu ombro. Era o carro de Axel, voltei a reler a placa e assenti para mim próprio. - Acho que o meu irmão está aqui. - Apontei para o veículo, mas fui atrás dela. Mesmo que eu não quisesse estar ali, mais valia subir porque não ia obrigar o meu irmão a sair de um sítio para me levar a casa, não era tolo e egoísta a esse ponto.
Subimos até sua casa e esperei que ela abrisse a porta. - Olivia. - Chamei baixinho. - Não digas a ninguém aquilo que eu te contei de mim hoje. - Pedi. - Eu... eu não gosto que se espalhe...

Juntei as sobrancelhas e olhei para o carro que o Aaron estava a apontar - Hmm então o meu irmão está em casa. - constatei enquanto subíamos para o nosso andar e abria a porta à espera de os ver na sala mas não - Devem estar no quarto. - acrescentei com um encolher de ombros e fechei a porta depois do Aaron entrar, atirando-me de seguida para o sofá - Não vou dizer nada. - apressei-me a descansá-lo - Não precisas de te preocupar com isso.