Discoteca

As ruas estavam já bastante escuras e apenas eram iluminadas pelas luzes já acesas dos candeeiros. Eu caminhava lentamente pela mesma, meio absorvido nos meus pensamentos e na porcaria de vida que eu tinha. Acabei por virar numa outra direção, indo assim de encontro a um bar que por vezes eu frequentava. Um dos muitos bares que eu frequentava, na verdade. Passei pelas pessoas que o enchiam naquele momento, empurrando por vezes algumas e ignorando todos os seus resmungos. Deviam pensar que eu me importava com o que me diziam. Revirei os meus olhos para mim próprio e finalmente cheguei ao balcão. Encostei-me contra o mesmo, apoiando os meus braços nele e fiz sinal a um dos empregados, que rapidamente se colocou à minha frente. Pedi-lhe uma bebida qualquer, já que desde que tivesse álcool por mim estava tudo bem. Ele logo me serviu a mesma num copo e de imediato levei o mesmo aos lábios, bebi o conteúdo todo de uma só vez, pedindo novamente em seguida para ele voltar a encher o meu copo.

Deixei a cabeça pender, mal a batida começou a tornar-se mais rápida e pesada e deixei o meu corpo flutuar ao som da música. Tudo parecia tão mais fácil quando estava ali, naquela discoteca, sozinha, sem problemas à minha volta. Senti um pequeno sorriso desenhar-se nos meus lábios e fui abrindo os olhos aos poucos, agarrando-me ao balcão para não cair. Hoje era dia de esquecer que o meu pai existia, que os meus irmãos existiam, que a vida por si só existia. Era por isso que ali estava, e era por isso que ia fazer o que quer que fosse, sem me preocupar com nada.
Levei a mão de forma instintiva ao bolso, tirando de lá mais um dos meus cigarros e pousei-o de imediato sobre os lábios, não hesitando em acendê-lo. Olhei em volta enquanto o fumava e e foi então que reparei na presença de um rapaz mesmo no banco perto de mim. Semicerrei os olhos, tentando decifrar o seu rosto por entre o fumo e rapidamente estes se reviraram, ao vê-lo com um copo na mão.
- Mas o que é que vocês veêm de tão interessante no álcool? - gritei-lhe, pouco me importando com o facto de não o conhecer de lado nenhum.- só vos faz ficar ainda mais nojentos.

Mais algumas bebidas me foram servidas, até que cheguei a um momento em que comecei a achar que o empregado me deveria de dar logo a garrafa inteira, poupava não só trabalho a ele como também a mim. Passei a minha língua pelos lábios saboreando os restos da bebida que ainda se encontravam nos mesmos. Uma das minhas sobrancelhas arqueou-se de forma ligeira assim que comecei a ouvir uma voz bastante perto de mim. Perto o suficiente para eu perceber que estava a falar para mim. Além de que as coisas que dizia também indicavam isso. Voltei o meu rosto na sua direção, focando os meus olhos no seu rosto. - O mesmo que tu vês nisso, talvez. - disse apenas, referindo-me ao cigarro que estava por entre os seus lábios. - Digo-te o mesmo. - acrescentei, num tom de voz bastante indiferente.

O mais me agradava no ato de fumar, e de ingerir todas as coisas que costumava ingerir, era o facto de ficar tão leve, tão inconsciente que nada do que dizia ou fazia me importava minimamente. Na verdade, nada me importava de todo. Dei mais um bafo no cigarro, travando o fumo na minha boca durante alguns segundos e só depois o soltei, sentindo todo o meu corpo vibrar com o efeito que aquilo tinha em mim. Era tão bom não ser eu.
- Eu quero lá saber.- respondi de imediato, assim que as palavras do rapaz ecoaram na minha cabeça. Estava tão dormente que até me esquecera de que tinha falado com ele.- ao menos morro feliz.- pisquei-lhe o olho, acabando por me sentar no banco ao seu lado e esticar uma mão para lhe tirar o copo da mão e deixar cair nos meus lábios a única gota de líquido que ainda havia no copo. Má escolha.- que nojo.- cuspi, dando de imediato um bafo no meu cigarro.- devias deixar de beber.- repeti, sabendo que não estava a fazer sentido nenhum. Ainda assim, estiquei o meu cigarro na sua direcção.- queres experimentar? Vais ver como é muito melhor.

As coisas que ela dizia não faziam sentido nenhum, e portanto rapidamente cheguei à conclusão de que ela não estava nada no seu estado normal. Mas quanto a isso eu não podia falar muito, já que o meu estado neste momento também já não era complemente sóbrio. Se bem que em comparação com ela eu estava bem melhor. Continuei com o meu rosto virado para ela, seguindo com o olhar aquilo que ela estava a fazer. - Eu também morro feliz, não te preocupes. - retorqui, referindo-me ao álcool que estava a beber. Uni as sobrancelhas quando pegou no meu copo e abanei de forma ligeira a minha cabeça. - Quem és tu para me dar lições quando estás ainda pior que eu? - peguei de novo no meu copo deslizando-o para a minha frente. Deixei que o empregado o voltasse a encher, já que se encontrava vazio e em seguida dei novamente alguma atenção àquela rapariga, que não estava a fazer sentido nenhum. Peguei no seu cigarro e levei o mesmo aos meus lábios. Dei um bafo no mesmo e em seguida expeli o fumo bem na direção do seu rosto. - Eu também fumo. - disse-lhe piscando o meu olho. Voltei e entregar-lhe o cigarro e dediquei a minha atenção ao copo. - Mas prefiro isto. - encolhi os ombros. A bebida fazia-me esquecer a porcaria de vida que eu tinha naquele momento. Tudo me corria mal e como se não bastasse tinha perdido mais uma oportunidade de trabalho. Tinha de afogar as mágoas de alguma forma. E aquilo era basicamente a minha desculpa para beber todas as noites.

Apesar de saber que o rapaz continuava a falar comigo, devido ao movimento que os seus lábios iam fazendo, o meu cérebro apagou metade das suas palavras, só voltando a despertar assim que a sua boca expeliu o fumo do meu cigarro, em direcção à minha cara. Arregalei ligeiramente os olhos, ficando parada durante breves segundos apenas a olhar para ele e, apesar de inicialmente a minha cara se preparar para lhe mostrar uma expressão zangada, que era a única expressão que eu sabia ter quando não fumava, acabei por lhe dirigir um leve sorriso.
- Não sabes o que perdes.- murmurei apenas, oferecendo-lhe um encolher de ombros e dei um pequeno salto para o chão, aproximando-me ligeiramente dele para agarrar no meu cigarro. Voltei a pousá-lo sob os meus lábios, sugando algum do seu fumo e para lhe pagar na mesma moeda, estiquei-me até à sua cara, acabando por expelir o fumo em direcção à sua boca.- foi um prazer conhecer-te, bêbado.- murmurei, com os meus lábios demasiado próximos dos seus, mas rapidamente me afastei, piscando-lhe o o olho, antes de lhe virar as costas e ir para a pista. A única coisa menos positiva de tudo aquilo era que, caso estivesse sóbria, nunca teria tido aquela atitude. Aliás, o mais provável teria sido nem chegar a meter conversa com o rapaz. Não gostava de pessoas. Contudo, não podia deixar de admitir que até me tinha divertido. Era bom não ter nada na cabeça de vez em quando.

Ia alternando a minha atenção entre o copo de bebida que ainda tinha comigo e a rapariga, que continuava ali. As atitudes dela eram completamente fora do normal, mas eu começava a não ligar nada a isso visto que quanto mais ia bebendo menos normal eu me encontrava também. Abanei um pouco a cabeça, rindo-me ligeiramente do que ela estava a dizer. - Não devo perder grande coisa. - limitei-me a dizer com um encolher de ombros. Bebi o resto do que tinha no copo, não deixando no mesmo nenhuma gota de bebida e lambi os meus lábios enquanto fitava de forma atenta o rosto da rapariga, que dava para ver perfeitamente mesmo que as luzes naquele local não estivessem completamente acesas. - Digo o mesmo, drogada. - retorqui de volta ficando em seguida a vê-la afastar-se. Encolhi os meus ombros para mim próprio e aproveitando que o empregado estava distraído, peguei na garrafa de bebida ainda cheia que estava sobre o balcão. Mordi o meu lábio olhando por momentos a garrafa e antes que ele percebesse que tinha roubado a bebida, afastei-me do balcão. Caminhei em seguida até à saída daquele bar, bebendo alguns goles da garrafa e comecei a caminhar pela rua, para longe dali.

Comecei a conduzir em direção à morada que tinha visto no seu telemóvel e felizmente nem sequer ficava muito longe da nossa casa. - Sim. - murmurei em resposta assentindo um pouco com a cabeça enquanto procurava um lugar para estacionar. Assim que o fiz parei o carro e desapertei o cinto, voltando depois a minha atenção para o Aaron. - Estás bem? - procurei saber. Não suportava a ideia de algo de mal lhe acontecer, iria sentir-me culpado por isso para sempre. Se bem que estava com a sensação que iria correr tudo bem e ele se ia divertir. E eu também, assim o esperava. - Vamos. - disse em seguida preparando-me para sair do carro.

Era a primeira vez que saia decentemente de casa, a minha irmã já tinha tentado várias vezes, mas agora estava a aproveitar-se do facto de não me dar mais comprimidos, para me obrigar a sair do sofá. Não estava no meu melhor e não sabia do que esperar quando estivesse no meio de tanta gente, mas não ia acontecer nada de mal, pois não? Não, ia ficar tudo bem. Assenti-lhe, verificando a bateria do meu telemóvel para depois o voltar a colocar no sítio.
Quando chegámos, soltei um suspiro, observando o ambiente há minha volta. - Lembro-me de fugir dos pais para vir a uma discoteca, acho que foi aí que eles começaram a odiar-me.

Levantei a cabeça quando ouvi o meu irmão a falar e assenti. - Estou, ainda não entrei. - Respondi, abrindo a porta do carro para sair, quando ele estacionou. Olhei para o telemóvel, à espera de uma mensagem e mordi o lábio inferior. Fui atrás de Axel, olhando para todos os lados, à procura de encontrar os dois irmãos, mas havia tanta gente a dirigir-se ao mesmo sítio que nós, que acabei por desistir.

Graças a um milagre divino consegui arranjar lugar não muito longe da discoteca e saí do carro, agarrando-me ao braço do Ben mal percebi que o seu humor continuava a não ser o melhor - Eu acho que eles nunca gostaram verdadeiramente de nós. - encolhi os ombros - Não me lembro de alguma vez terem estado connosco como é suposto os pais estarem com os filhos. - fomos caminhando até à zona da discoteca e fui prestando atenção às pessoas que ali se encontravam - Já os vi. - disse com um sorriso e puxei o Ben para irmos ter com os gémeos.

Fui andando para a zona de entrada da discoteca, sempre ao lado do Aaron e perto dele numa tentativa de o fazer-se sentir mais seguro. - Estás a vê-los? - perguntei olhando em volta para tentar procurá-los e quando estava prestes a desistir acabei por ver duas cabeças aloiradas e logo percebi que eram eles. - Estão ali. - disse para o Aaron vendo depois que já caminhavam na nossa direção.

Acabei por não comentar mais nada sobre os nossos pais, não era o sítio mais adequado para ficar deprimido por causa deles, já estava mal humorado o suficiente. Eu devia fingir que eles já não me afetavam, como fingia a minha irmã.
Olhei em volta, embatendo com o olhar nos gémeos, principalmente na carapaça cor de rosa do preferido da minha irmã. Revirei os olhos, percebendo que aquilo estava a tornar-se real e, mesmo quando chegámos ao pé deles, não consegui que o meu humor melhorasse. - Olá. - Cumprimentei-os de forma rápida. - Tu vais pagar-me uma bebida. - Apontei para Axel.

-Sim, já os vi. - Engoli em seco quando vi Olivia ao longe, observando a sua produção e a forma como o top que ela usava, mostrava parte da sua pele. - Ela está gira. - Disse, quando eu e o meu irmão ainda estávamos sozinhos. Olhei para o irmão dela, que não parecia muito bem humorado, e desviei o olhar para o meu, abanando a cabeça por não entender o que é que ia na cabeça deles. - Olá. - Obriguei-me a dizer, para ser bem educado.

Sabia que o Ben continuava de mau humor mas acabei por sorrir quando mal chegámos junto do Aaron e do Axel ele disse a este último que lhe ia pagar uma bebida. Ao menos não estava a pensar passar o tempo todo a um canto chateado - Olá. - cumprimentei os dois ainda a sorrir e olhei parao Aaron que era aquele que estava com uma expressão mais sofrida por ali estar - Acho que tu também precisas de uma bebida.

Fiquei a vê-los aproximarem-se de nós e não pude deixar de reparar na Olivia assim que o Aaron comentou algo sobre ela. Era bem gira, não podia deixar de reparar, mas bem, o irmão dela também era, por isso já nem sabia para qual deles olhar. - Olá. - disse para os dois assim que nos cumprimentaram. Arqueei uma sobrancelha assim que o Ben falou para mim. - Desculpa? Porque faria isso? - perguntei, revirando ligeiramente os meus olhos.

Fiz uma careta a Aaron, que não parecia perceber que estava a ser inconveniente enquanto fitava a minha irmã, ou melhor, o peito da minha irmã. Abanei a cabeça e quando voltei a fitar Axel revirei-lhe os olhos ao vê-lo fazer o mesmo. - Porque, se vamos estar aqui a noite inteira, vou precisar de muito álcool, e eu sou aquele que está de mau humor, por isso, é o mais acertado. - Falei calmamente, começando a andar e a ocupar o meu lugar na fila.

Juntei as sobrancelhas quando o irmão de Olivia me mandou um olhar esquisito, mas não tive tempo de pensar no assunto, quando a própria falou. - Eu não preciso. - Abanei a cabeça. - Eu não bebo. - Acrescentei, começando a seguir Benjamin, quando também começaram todos a andar em direção a uma fila... com muita gente. Respirei fundo, olhando em volta, mas tentei manter-me confortável -- o pior estava dentro.

Continuei a olhar para o Axel e para o Ben enquanto falavam um com o outro e tentei não sorrir. Olhei novamente para o Aaron e juntei as sobrancelhas com a sua confissão mas não era estranho de todo que ele não bebesse - Tudo bem. De qualquer das maneiras, anda daí. - consegui controlar-me e evitar agarrar-me ao braço dele como fazia tantas vezes a tanta gente sabendo que o mais certo era o Aaron ter um ataquezinho por isso limitei-me a seguir o meu irmão assim que ele se começou a dirigir para a fila da entrada.

Olhei por segundos para o Aaron para ver se estava tudo bem com ele e logo voltei a olhar de novo para o Ben. - Eu também preciso de muito alcool. - como em todas as noites que vinha sair, acrescentei em pensamento. Andei com ele, colocando-me atrás dele na fila para entrarmos. - Porque é que tenho de te pagar eu e não pagas tu? - perguntei-lhe.

Assenti, contente por ele concordar com a abundância de álcool que precisávamos, e entrei quando me deixaram, depois de me revistarem, ou o que quer que tenham feito. Parei à entrada, com vontade de dar meia volta e voltar para trás. A música fazia o meu corpo tremer com a vibração das colunas espalhadas no lugar, e sim... eu precisava de muito álcool. -Porque tens essa cara. - Respondi, como se fosse muito óbvio. - Os mais feios pagam sempre a primeira rodada.

-Mas posso... - Calei-me antes de acabar a frase, juntando as sobrancelhas quando um homem que parecia um segurança, começou a pedir para levantar os braços. Olhei para Olivia, para os dois homens à minha frente e para o meu irmão, que já ia à frente, mas apressei-me a fazer o que eles me pediam, ficando mais confuso do que já estava, quando me disseram que podia passar. - Eu posso beber... só um bocado. - Completei o que estava a tentar dizer, depois de Olivia também conseguir entrar.

Apesar da quantidade de pessoas que estava na fila até não demoramos muito tempo a conseguir entrar na discoteca. Olhei para o Aaron com um sorriso quando ele disse que podia beber e tive de me aproximar dele para me fazer ouvir por cima de todo o barulho daquele espaço - Ótimo, anda daí. - disse-lhe junto ao ouvido antes de agarrar na mão dele e puxa-lo para a zona do bar para onde sabia que também se dirigia o Ben juntamente com o Axel.

Entrei na discoteca assim que acabaram de me revistar e olhei para trás, vendo que o Aaron e a Olivia também já tinham entrado. - Se formos por aí podes ter a certeza que não seria eu a pagar. - encolhi os meus ombros começando a andar em direção ao bar com ele. - Mas pronto, eu pago só porque até me apetece ser um bocadinho simpático. Mas não abuses porque a minha simpatia acaba-se rápido. - retorqui encostando-me ao balcão assim que chegamos à zona do bar.