Prince of Wales Private Hospital

-O que é que estás a dizer, Aaron? - Perguntou o meu pai, sempre tive medo dele, é um homem que perde a paciência com facilidade e está sempre a tentar meter respeito com a voz alta. 
-Eu não quero ir com vocês. - Voltei a repetir.
-Isso eu já sei, mas porquê? - Engoli em seco, descendo o olhar dele para o chão. A enfermeira ainda estava no nosso meio, a tentar compreender o que se estava a passar e a impedir que as vozes aumentassem.
-Deram um apartamento ao meu irmão, porque é que não me podem dar um a mim? Estou melhor sem vocês. - Encolhi os ombros, vendo a minha mãe abrir a boca, mas não foi pelo meu comentário, mas sim com a presença de Axel no mesmo espaço que nós. Os meus olhos abriram-se, mas senti um enorme alívio ao perceber que ele não se tinha esquecido totalmente de mim.
-Achas mesmo que vamos deixá-lo ir contigo? - Foi a vez da nossa mãe falar, mas eu já lhe estava a dar a minha mochila. - Mal sabes cuidar de ti.
-Eu quero ir com ele. - Respondi, antes que alguém pudesse antecipar-se. - Tenho vinte e um e não sou um atrasado mental, não preciso que cuidem de mim, já aprendi a fazê-lo sozinho.

Evitei ao máximo revirar os olhos devido ao que a nossa mãe disse, mas acabei mesmo por o fazer, fazendo questão que ela reparasse. - Vocês também não sabem cuidar de nós, portanto acho que estamos quase em pé de igualdade. - encolhi os ombros de forma descontraída e segurei na mochila do Aaron, mantendo-me junto a ele. Ignorei os olhares do nosso pai e quando reparei que ele ia dizer algo, apressei-me a falar antes. - O Aaron tem razão. Além de que ele pode muito bem escolher para onde quer ir, e lamento que vocês não sejam a escolha. - sorri de forma irónica para ambos. Eles já não gostavam de mim portanto estava-me a lixar completamente para a forma como falava com eles. Só queria nunca mais ter de olhar para aquelas caras. Virei o meu rosto para a enfermeira que estava com o Aaron. - É preciso mais alguma coisa? - perguntei, desejando conseguir sair logo dali, levando o meu irmão comigo, de preferência.

Os nossos pais ficaram calados por momentos, estavam preocupados com a imagem e em como não podiam armar um escândalo à entrada de uma ala psiquiátrica. Eu sabia que eles me iam deixar ir com ele, mas isso não significava que me fossem deixar em paz.
-Tu vais com ele, Aaron. - A nossa mãe deu um passo na minha direção. - Mas acredita que vais aqui voltar mais cedo do que pensas. - Juntei as sobrancelhas, afastando-me pronto para sair.
A enfermeira ao nosso lado abanou a cabeça, ligeiramente atarantada com a conversa. - Não, já está tudo pronto, podem ir. - Assenti, olhando para o meu irmão com um sorriso, e apressei-me a sair à sua frente, para longe dos nossos pais.

Mordi o meu lábio satisfeito quando a nossa mãe começou a falar, mas claro que por trás das suas palavras tinha de vir uma ameaça, nem que fosse para mostrar quem mandava ali. - As ameaças não os vão levar longe. - pisquei-lhe o olho de forma a provocar e logo em seguida desviei a minha atenção tanto da nossa mãe como do nosso pai. Assenti para o que a enfermeira disse e assim que o Aaron começou a andar, eu logo segui atrás dele, ignorando os nossos pais por completo e sorrindo com bastante satisfação. - Finalmente! - exclamei quando por fim chegamos à rua e segurei ligeiramente o braço do Aaron, puxando-o comigo em direção ao lugar onde tinha deixado o meu carro.

Tinha adrenalina a passar por todas as minhas veias, as pontas dos meus dedos até formigavam. Eram raras as vezes que ia contra a vontade deles, quando o fiz pela primeira vez tinha ido parar àquele hospital. Talvez eles até quisessem o melhor para nós, mas não o mostravam da melhor maneira, principalmente, para o meu irmão. - Como é que sabias? Porque é que vieste? - Perguntei, deixando que ele me guiasse até ao seu carro. - Não estás com bom aspeto, Axel. - Comentei.

Continuei a andar, lado a lado com o Aaron e virei por segundos o meu rosto na direção dele, ao ouvir a sua pergunta. - Liguei para o hospital há uns tempos e pedi para me ligarem caso acontecesse algo relacionado contigo. - encolhi um pouco os meus ombros e segurei melhor a mochila. - Assim que me ligaram eu vim logo, sabia que os nossos pais iam chegar logo e tinha de ter a certeza que não te levavam com eles. - parei perto do meu carro e olhei para o Aaron. - Eu nunca estou com bom aspeto. - suspirei de forma audível. - Passei a noite a beber, se é isso que queres saber. - destranquei depois o carro e coloquei a mochila nos bancos de trás. Entrei depois no lugar do condutor, esperando que ele entrasse também no carro.

Suspirei profundamente ao ouvir as coisas que o Aaron dizia sobre os nossos pais. - Já sabes como eles são, enfim. Não interessa, no que depender de mim nunca mais vais voltar para aquela casa. - encolhi os meus ombros e depois de colocar o carro a trabalhar, comecei a conduzir para fora daquele lugar. Onde eu esperava não ter de voltar tão cedo, fosse porque motivo fosse. - É, eu sei. - abanei um pouco a cabeça, desviando rapidamente o assunto de mim para ele. Não queria falar nada sobre mim, até porque não havia nada para falar sobre a minha vida que estava a ficar completamente arruinada. - E tu? Como tens andado? Como foi no hospital? - questionei-o, sem desviar o meu olhar da estrada.

Desviei o olhar para o exterior, absorvendo os pormenores que não existiam antes. Muita coisa mudava em um mês; neste, tinha mudado as cores. Já não havia nuvens no céu e as cores estavam mais brilhantes com a vinda do verão. Detestava usar muita roupa, por isso, a primavera o verão eram perfeitos para mim.
-Estás mesmo a perguntar-me isso? - Revirei os olhos. - Pacífico, não tinha ninguém a gritar-me aos ouvidos. - Acabei por responder, mas mudei logo de assunto. - Tens um quarto livre para eu poder pintar? Eu gostava de ter um atelier só para mim, para eu pintar, porque assim tenho mais espaço e não fico intoxicado com o cheiro enquanto durmo. - Forcei-me a calar, pressionando um lábio no outro. - Tens?

Continuei a conduzir sempre de forma atenta e um pequeno sorriso foi surgindo nos meus lábios à medida que ia ouvindo as coisas que o meu irmão dizia. Não havia nada melhor para mim do que o ver entusiasmado com as coisas de que ele gostava. Ele era a pessoa de quem eu mais gostava e com quem eu mais me preocupava. Acho que se tivesse de dar a vida por ele, eu faria-o sem pensar sequer duas vezes. Assenti brevemente com a cabeça assim que por fim ele parou de falar. - Sim, tenho. Podemos ter tudo o que quiseres. A casa é bastante grande, há espaço para tudo. - olhei-o de relance e sorri para ele. - Bem, o que queres fazer no resto do dia? - questionei-o, não me importando que a minha vontade fosse apenas de dormir durante uma semana inteira.

Inspirei profundamente, com um sorriso no rosto a que já não estava habituado a ter, até que me lembrei - de forma bastante aleatória - da rapariga drogada que "ajudei" a fugir. Abanei a cabeça para parar de pensar nela e foquei a minha atenção na sua pergunta, tentando ver em que zona de Sydney estávamos. - Quero um gelado. - Comer gelados deviam ser a segunda coisa que mais gostava de fazer no verão, a primeira era andar quase nu.

Coloquei novamente a minha atenção na estrada e assenti com a cabeça ao que o Aaron disse. - Está bem, vamos comer um gelado então. - mudei de direção, conduzindo agora para a gelataria que ficava mais próxima do sítio onde nos encontrávamos. - Já tinha saudades de passar algum tempo contigo. - acabei por dizer ao fim de um pouco. Eu não era nada de mostrar às pessoas que gostava delas. Detestava ser querido mas o meu irmão não era qualquer pessoa, por isso não fazia mal de vez em quando dizer aquelas coisas.

Batuquei com a mão no apoio da porta, apesar de estar feliz por estar livre e fora de casa dos meus pais - melhor de tudo, com o meu irmão gémeo - não conseguia deixar de me sentir nervoso. Detestava muita coisa, mas o que me stressava mais era dias de mudanças inesperadas, e isto era uma grande mudança inesperada.
-Podias ter ido visitar-me mais. - Murmurei, apesar de saber que os meus pais acabariam por descobrir e o mais provável era barrarem-lhe as visitas. - Eu também tinha, Axel. - Admiti.

Suspirei de forma leve ao ouvir o que ele disse. - Sim, eu sei. Desculpa, as coisas não tem sido fáceis. - encolhi um pouco os ombros. Por vezes preferia mesmo não o visitar, para ele não ver o estado péssimo em que eu sempre estava. - Mas não importa isso agora. Já estás aqui e vamos passar mais tempo juntos e evitar a todo o custo que voltes para aquele lugar. - murmurei sorrindo um pouco para ele de forma amigável.

Assenti, sem querer entrar em terrenos perigosos, como era aquela conversa. Não ia ficar chateado por causa dele não me ter visitado, mas os porquês dele não o fazer incomodavam-me. Ele estava sempre a sair à noite, a meter-se em coisas que não devia e a destruir-se. Não podia julgá-lo, porque apesar de não gostar de discotecas, não me importava de beber ou fumar quando me apetecia, mas ele andava a exagerar.
-Eu só fui parar àquele lugar porque os pais proibiram-me de pintar e de estar contigo, por isso, acho que já não acontece tão depressa. - Encolhi os ombros, esperando que ele estacionasse para sair.

- Eles acham que sabem cuidar de nós, mas por vezes só fazem pior. - encolhi os ombros, já estava habituado às atitudes estúpidas que ele tinham connosco. Como já tinhamos chegado à gelataria, procurei um lugar onde estacionar o carro. - Já vais poder fazer essas coisas agora e tudo o que quiseres. - acrescentei em seguida e parei depois o carro. - Vamos. - retirei o cinto de segurança e depois sai do carro, esperando que ele fizesse o mesmo.

Estava um dia caótico no trabalho. Lá por ser um hospital privado não queria dizer que pudessem encher-nos de trabalho como se o dia tivesse infinitas horas! O pior disto eram os miudos, nao conseguia dizer que não aos pais. Fiz uma pausa para almoço quando o chefe do Hospital veio ter comigo para me informar que o Dr. Rascall se tinha reformado, facto que desconhecia! e que o substituto iria chegar hoje.
Pior, eu tinha de ser a supervisora desse novo médico no dia de hoje. Fiquei passada. Tive de desmarcar todas as consultas. Fui até a janela voltada para as traseiras e acendi um cigarro, esperando pelo novo colega.

Tinha antecipado a minha chega a cidade uns dias antes para me poder installar como deve de ser no meu apartamento novo e tambem para conheçer um pouco a cidade e acertar todos os promenores para o meu trabalho. Começava hoje por isso apresentei-me na recepção da clinica, identifiquei-me e disseram-me que a Dr. Prescott estava a minha espera. Indicaram-me qual era o seu gabinete e agradeçi, seguindo até ao mesmo com as indicações dadas pela receptionista. Bati a porta esperando uma resposta.

Bateram à porta e revirei os olhos. Apaguei o cigarro e mandei a beata pela janela fora. Vesti a bata novamente mas deixei-a aberta, nao era nenhum paciente.
Abri a porta e sorri cordialmente.
-Deve ser o Dr. Kingston, entre por favor. - Peguei nos papéis que ele tinha de assinar e sentei-me na minha secretária, observando-o discretamente.

Abri a porta e entrei ao ouvir resposta. Bom dia. Cumprimentei com um sorriso simpatico, não gostava de me dar mal com os meus colegas de trabalho. Senti o cheiro de tabaco, isto ia começar muito bem! Odiava aquele cheiro! Mas nem comentei nada. Sentei-me na cadeira em frente a sua cadeira.

Ele tinha ar de quem ia querer ser o queridinho. Não tinha paciência. A sorte dele é que era atraente mas isso era indiferente.
- Ora bem, Dr. Kingston, tenho imensa papelada para que preencha. Deixando um pouco as formalidades de parte, o meu nome é Lauren Prescott. Sou a responsável pela Psicologia Infantil e, alguns casos psiquiátricos, Traumatologia. Como sabe, o Dr. Rascall conseguiu uma reforma antecipada e voce veio para o seu lugar. Ainda não tenho a documentação do seu antigo posto, os serviços internos exigem-me que lha peça. Só assim lhe poderei dar o seu horário inicial.  - Parei para observar a reacção dele e estendi-lhe a papelada, juntamente com uma caneta.

Ouvi-a com atenção e assenti ligeiramente com a cabeça. Claro, eu compreendo. Disse apenas e começei a ler atentamente toda a documentação que ela me tinha dado, tudo batia certo com a proposta. Começei a preencher e assinar tudo o que preciso. Penso que não me esqueçi de preencher ou assinar em nenhum lugar. Peguei o pequeno monte de papeis e estiquei-lhe os mesmos.

Peguei nos papeis e revi tudo com atenção. Estava tudo preenchido com uma caligrafia impecável. Assenti que sim e levantei-me.
-Está tudo bem, acompanhe-me agora aos serviços internos, se não se importar. Estou encarregue de o supervisionar no dia de hoje. - Voltei-me para trás e olhei-o. - Sei que é chato mas faz parte do protocolo e tenho de cumprir. Amanhã os pacientes do Dr. Rascall passam para si.
Sabia que estava a ser super fria mas não sabia ser de outra maneira. Não conhecia de lado nenhum e algo me dizia que não era boa peça. Abri a porta e saí, esperando que ele me seguisse.

Esboçei um pequeno sorriso, optimo! Odiava quando me enganava ou cometia algum erro por falta de atenção. Com todo o gosto. Levantei-me pronto a segui-la. Eu não acho chato, é questão de profissionalismo. Segui atras dela pelos enormes corredores da clinica.

Fui mantendo conversa para não parecer arrogante de mais. Tratámos da papelada toda nos serviços internos, depois mostrei-lhe a clinica de uma ponta a outra, o que nos levou a estar quase uma hora só a andar de um lado para o outro.
Entretanto, já era hora de almoço.
-Normalmente, quando não temos muito tempo para almoçar, levamos algo para o gabinete. Hoje dá tempo. - Parei de andar e olhei-o. - Existe ali o refeitório. Não sei se prefere ir dar uma volta e daqui a meia hora encontramo-nos no meu gabinete para o por a par de certos casos ou se prefere almoçar por aqui. É consigo. - Sorri levemente.