Quarto do Ben

-Quem me dera. - Suspirei baixinho, virando-me de costas para ele, como me tinha deitado inicialmente e fechei os olhos, tentando descontrair e não pensar em coisas más, ou melhor, relembrar memórias más. Aquela lamechice dos filmes, em que ao dormir com outra pessoa, as insónias desaparecem é treta, porque até com a minha irmã eu já tentei dormir e nunca foi a mesma coisa.
Com algum esforço, a tentar pensar em nada, consegui adormecer durante um breve período de tempo, mas as coisas más voltaram quando me apanharam distraído e os meus olhos abriram-se. Suspirei, apetecendo-me matar a minha irmã por me ter tirado a única coisa que me ajudava a descansar, e enfiei a cabeça na almofada, esperando que o tempo passasse até todos em casa acordarem.

Não sabia quanto tempo se tinha passado enquanto estive a dormir. Mas estava a dormir bem porém acabei por acordar, meio à toa, sem saber por momentos onde estava. Mas rapidamente me lembrei. Empurrei o lençol para trás destapando-me e mantive os meus olhos fechados. - Ben, estás acordado? - murmurei baixo para não o acordar caso ele estivesse a dormir.

Levantei a cabeça ao sentir movimento do lado da cama em que Axel estava, conseguindo reparar melhor na sua silhueta graças à pouca luz que começava a existir na rua. Fitei o despertador que estava do meu lado, suspirando de alívio por perceber que eram cinco da manhã e o tempo não estava a passar assim tão devagar -- em parte por nos termos deitado tarde. - Estou. - Respondi assim que ele falou comigo. - Precisas de alguma coisa?

Abri os olhos por momentos apenas para ver se já estava a ficar dia ou se ainda seria de noite. - Não preciso de nada. Mas será que o Aaron está bem? - perguntei. Nunca conseguia deixar de me preocupar com ele mesmo sabendo que naquele momento ele deveria estar bem e talvez a dormir. - Quer dizer, se estivesse mal eu já saberia. - acrescentei em seguida com um encolher de ombros.

Sentei-me na cama, sem vontade nenhuma de estar deitado, já me tinha fartado de tentar adormecer, os meus olhos estavam pesados e queriam fechar, mas isso não significava que conseguisse dormir.
Acabei por sorrir ao ouvi-lo. - Tão querido, a preocupar-se com o irmão. - Revirei os olhos a mim próprio por ser tão estúpido. - Sim, já saberias. - Encostei as costas às almofadas. - A não ser que... - fiz uma careta, decidindo que era melhor calar-me. - A minha irmã conheceu-o no hospital, ele tem alguma coisa de grave?

- É a única pessoa que tenho e de quem gosto, basicamente. E sim, preocupo-me bastante com ele. - murmurei mais para mim próprio do que para o Ben. Mordi o interior da minha bochecha com a sua pergunta. - Prefiro não falar sobre isso... - disse apenas. Não gostava de falar com outras pessoas sobre as coisas relacionadas com o Aaron, pois nunca sabia se ele se importava que eu dissesse ou não, portanto preferia ficar calado. - Desculpa. - acrescentei em seguida. - Estás tapado? - perguntei-lhe depois, visto que já estava a ficar de dia.

Deixei-me ficar calado a fitá-lo enquanto estava de olhos fechados, e reparei que não éramos assim tão diferentes. Liv também era a única pessoa que tinha e a que mais gostava, por quem dava a vida sem pensar duas vezes. - Eu compreendo-te, mas ele está bem. - Garanti-lhe. - A minha irmã não é assim tão má... - acrescentei com alguma hesitação.
Encolhi os ombros, ao ouvi-lo dizer que preferia não falar sobre o assunto. - Não tens que pedir desculpa, idiota. - Ri-me. -[v] Desde que ele não seja um sociopata, eu não me importo.[/b] - Comentei, esfregando a cara para afastar o cansaço. Levantei uma sobrancelha, desviando o olhar para o meu colo. - Estou e já me vesti, não te preocupes, não vais ver nada que te desgrace a tua pobre alma pura.

Assenti brevemente com a cabeça. - Ela pode não ser assim tão má, mas o Aaron é bom demais. - comentei. - Mas pronto, de certeza que está tudo bem. - conclui com um encolher de ombros e decidindo não me preocupar mais com aquilo. Pelo menos naquele momento. - E não, ele não é nenhum sociopata. Como eu disse, o Aaron é bom demais. - virei em seguida o meu rosto na direção do Ben e ri-me levemente. - Ainda bem, podia não me conseguir controlar. - brinquei.

-Assim não me vou preocupar. - Encolhi os ombros, deslizando pelas almofadas até ficar deitado de novo. A minha irmã não era má, ela só se metia em caminhos menos bons, mas isso devia ser defeito de família já que eu também já tinha tido dias melhores. Estiquei uma mão para trás da cabeça, apoiando-me nela, e suprimi um sorriso ao ouvi-lo falar. - Podias não te conseguir controlar? Dormiste três horas, acho que não te aguentar em pé, quanto mais... - Decidi calar-me por causa do duplo sentido das minhas palavras.

- Ainda bem, eu também não. - murmurei apenas. Arregalei um pouco os olhos ao ouvir as suas palavras e acabei por me rir baixinho ficando depois com uma expressão mais séria. - Tens um ar todo inocente e assim, mas já percebi que de inocente não tens nada, Benjamin. - comentei acabando por me virar para ele, ficando assim deitado de lado na cama. - E eu estou sempre pronto para tudo, quer durma muito ou pouco. - acrescentei logo em seguida.

Soltei uma gargalhada baixa ao ouvi-lo comentar que eu tinha ar de inocente. Não compreendia o porquê das pessoas estarem sempre a afirmá-lo, ou a dizer que era adorável ou fofinho. Talvez fosse fofinho... Mas inocente não era. - Não, não sou. - Admiti com um sorriso maroto, vendo-o virar-se para mim. Ai meu deus, para de pensar, Benjamin Wells. Soltei um suspiro discreto, esfregando os olhos para me distrair. - Fico contente por saber detalhes. - Foi a única coisa que consegui dizer antes que me comprometesse com as minhas palavras e ele pensasse outras coisas.

Ri-me levemente e assenti com a cabeça. - Já percebi que não logo quando nos conhecemos. - retorqui focando o meu olhar no seu rosto, que há medida que o tempo ia passando ia ficando cada vez mais visível visto que era impressionante a rapidez com que a noite dava lugar ao dia. - Ficas? Já imaginava. - meio que gozei com ele. - Então, o que fazes da vida? - perguntei, para puxar um novo assunto já que pelos vistos nenhum de nós parecia que ia dormir no tempo que ainda faltava até ser de dia.

Pisquei-lhe o olho, não tendo a certeza se ele conseguia ver. O melhor era mesmo ficar calado e não provocar de volta, porque a verdade é que não havia hipóteses comigo, e já nem era só por causa de Dinnah, era por causa de tudo no geral -- os meus pais, o acidente, os meus problemas, o facto de não conseguir um emprego.
Levantei as sobrancelhas quando ele mudou de assunto e entrou no campo privado da minha vida. - Estás a tentar conhecer-me, King? - Não ia contar-lhe que me tinha esquecido do primeiro nome dele porque isso era só... triste.
Agarrei-me à almofada e encolhi os ombros. - Nada. - Isto também era triste. - Ando à procura de emprego, queria voltar a estudar, mas... - Encolhi os ombros.

Mordisquei de forma discreta o meu lábio sem saber se lhe devia perguntar aquelas coisas. A verdade era que ainda mal nos conhecíamos e eu não tinha nada que me estar a meter naquilo, mas bem, era assim que as pessoas se ficavam a conhecer. - Não. Sou apenas uma pessoa bastante curiosa. - respondi a brincar e acabei por me rir baixinho, para lhe mostrar exatamente isso, que estava a brincar. Assenti com a cabeça ao ouvi-lo. - Então porque não vais estudar? Se é isso que queres, devias fazê-lo... - murmurei com uma cara confusa, sem perceber desde quando me tinha tornado alguém que dava conselhos aos outros. Principalmente quando eu não seguia os meus conselhos e muito menos os das outras pessoas.

Encolhi os ombros à sua pergunta, principalmente, ao seu conselho, porque sim, eu queria ir estudar, mas depois dos meus pais praticamente me ignorarem, mesmo depois de pensarem que já tinha morrido num sítio qualquer, eu não queria pedir-lhes mais nada. - Porque primeiro preciso de um emprego. - Respondi-lhe. - E para ter um emprego preciso de ser aceite nas entrevistas, e para ser aceite nas entrevistas preciso de não ser um zombie com problemas. Por isso, acho que ficamos na estaca zero. - Comentei de forma cómica, eu já era dramático o suficiente e não queria fazê-lo pensar que era ainda pior do que demonstrava. - Mas, já agora, o que é que tu fazes?

- És tão pessimista Ben. - comentei depois de ele falar, porque foi essa a primeira coisa que me passou pela cabeça. - Se quiseres muito alguma coisa e se te esforçares acabarás por a conseguir. - eu devia ainda estar bêbado para estar a dizer estas coisas, já que não era normal em mim. Encolhi os ombros para mim próprio. - Sou modelo. Um modelo meio falhado, mas sou. - murmurei baixando o meu olhar e suspirando de forma baixa.

Levantei as sobrancelhas, surpreendido com o seu comentário. Eu não era pessimista, só via a realidade. A minha cabeça era uma confusão por vários temas complicados, e eu não podia servir num café e estar sempre a perguntar ao mesmo cliente o que é que ele queria -- o que era o mais provável de acontecer... mas Axel não sabia disso. - Tu só dizes isso porque não me conheces. - Sorri, deixando uma mão apoiar-se na minha testa, fitando o teto. - Oh, tenho um modelo na minha cama. - Gozei, rindo-me. - A minha irmã também é modelo... às vezes. - Fiz uma careta. - Vocês os dois são parecidos.

- Sim, eu sei que não te conheço mas sei lá... acho que era o que diria a qualquer pessoa. Não sei, esquece. Eu nem sei porque estou a dizer estas coisas se nem eu as faço. - encolhi os ombros e mexi-me um pouco na cama, virando-me de novo para cima visto já estar farto de estar na mesma posição. - Sim, tens um modelo na tua cama. Um dia deixo-te ver fotografias minhas, mas depois não te babes muito para mim ou assim. - ri-me. - A sério? Já estou a ver que somos mesmo, mas nem tenho oportunidade de a conhecer direito além de que ela anda muito interessada no meu irmão e quase nem deve reparar eu existo. - comentei.

-Estou a ser aconselhado por um hipócrita. - Brinquei, rindo-me baixinho para que não se chateasse.
Levantei as sobrancelhas, fitando-o com o lençol pela cintura. - Porque é que eu preciso de fotos tuas se eu consigo ver-te em 3D daqui? - Perguntei, virando-me de barriga para baixo para me deixar mais confortável. - Ter ciúmes do teu irmão é feio, Axel. Podes muito bem falar com ela. - Ri-me, esfregando a minha cara na almofada. Abri a boca para continuar a dizer, mas esqueci-me do que ia falar, e fiz uma careta, relembrando-me da nossa conversa anterior.
-Eu tenho um problema de memória. - Admiti, e antes que pudesse explicar-lhe que era por isso que era complicado trabalhar ou estudar, lembrei-me que tinha deixado o gato trancado na varanda do meu quarto. - Fogo. - Resmunguei para mim próprio, levantando-me num salto, e agradeci-me a mim mesmo por me ter lembrado de me vestir. - Desculpa. - Pedi ao meu gato adorável que tinha passado a porcaria do dia inteiro sozinho na varanda e praticamente sem comida. - Anda cá. - Agarrei-o ao colo com um beicinho, colocando-o em cima da cama para se aquecer. - Este é o gato e eu sou um péssimo dono. - Afaguei-lhe o pelo cor de laranja.

Limitei-me a fazer uma careta dirigida a ela assim que me chamou hipócrita, no entanto nem disse nada pois sabia que ele estava apenas a brincar. Virei o meu rosto para ele acabando por me rir com o que ele disse. - Sou modelo de roupa interior também..terias oportunidade de me ver com menos roupa do que tenho agora, mas se não queres... - encolhi os ombros piscando-lhe o olho e logo arregalei um pouco estes assim que ele voltou a falar, algo que eu não estava à espera e muito menos algo que eu esperasse que ele partilhasse comigo. - Porquê? - foi a primeira pergunta que me veio à cabeça no entanto ele logo saiu da cama, deixando-me confuso a olhar para o que estava a fazer. Sentei-me na cama quando voltou a entrar no quarto. - Um gato. Gosto de gatos. - cheguei-me para mais perto de onde ele estava e afaguei o pelo dele. - Coitado dele então. - briquei. - Mas ele não parece achar que és um péssimo dono. - murmurei quando o gato se encostou mais ao Ben.

Mantive a minha boca calada porque... não! Eu não me ia babar. Nope. Ele era giro e... oh meu deus, para, Benjamin Wells. Respirei fundo, continuando a dar festas no focinho do meu gato.
-Eu também gosto de gatos. - Esfreguei a cara no pelo do meu animal adorável e ri-me por ser um idiota. Deixei que Axel afagasse pelo ao meu gato e brinquei com o seu rabo comprimido e farfalhudo. - Ele compreende-me. - Disse de forma dramática, abraçando o animal para depois o deitar em cima de Axel.

Acabei por me rir devido à forma dramática como ele tinha falado. - Os animais compreendem-nos sempre. Acho eu. - encolhi os ombros, já que a minha experiência com animais era praticamente inexistente. Eu mal sabia tomar conta de mim, quanto mais de um animal também. Mesmo que gostasse bastante de gatos. - É fofo. - disse agarrando no gato e sorrindo um pouco enquanto tocava no seu pelo fofo.

-Eu sei, os animais têm as características dos donos. - Mostrei-lhe um sorriso adorável, que pouco se via devido à pouca luz que ainda existia. Não gostava que me chamassem de adorável, mas a verdade é que eu era adorável.
Abri as cortinas, mandando-me depois para o colchão e soltei um pequeno suspiro. Estava cansado, mas não era nada que não aguentasse... por acaso... não aguentava. Fiz uma careta a mim próprio, até desviar a atenção para Axel. - Vamos tomar o pequeno almoço. - Dei a ideia, quando me lembrei que já não comia há quase 24h. A vontade continuava pouca, mas tínhamos que passar o tempo de alguma forma, já que nenhum de nós conseguia dormir.

- Já tinha percebido porque é que ele é todo fofo e assim. - brinquei rindo-me um pouco e continuei a acariciar o pelo do gato enquanto seguia com o olhar aquilo que o Ben ia fazendo. Assim depois com a cabeça à sua pergunta. - Sim, vamos. - respondi-lhe. Ainda me sentia cansado visto que não tinha dormido o tempo suficiente, porém teria de esquecer isso por agora visto que sabia que não iria voltar a dormir. Arrastei-me para fora da cama acabando por deixar o gato na mesma, que miou antes de andar preguiçosamente até ao Ben.

-Só me estou a aproveitar da companhia. - Tentei defender-me, levando um dedo ao ar para me impor, mas estava com demasiado sono para ser levado a sério. Abri a boca num bocejo e sorri ao ver a minha cama, esperando adormecer tão bem quanto tinha dormido no seu carro - ainda nem acreditava que tinha mesmo adormecido, mas nem valia a pena pensar porque não queria festejar antes do tempo. Só consegui tirar as calças, mas também não me preocupei em tirar mais roupa, já que Axel ainda se passava.- E estar comigo entretem muito mais do que estar a olhar para tectos. - Murmurei com a voz arrastada, puxando-o para se deitar.