Sydney Lodge Motel

— Pois... Acho que não é coincidência. — Encolhi os ombros e ri-me, tirando depois o telemóvel do bolso e ditando a morada. Voltei a guardar o aparelho e respirei fundo, olhando pela janela. Passámos pelo McDonald's, fizemos os nossos pedidos e seguimos caminho. Pelos vistos, a residência dele é tão secreta que tivemos de vir para um Motel. Ou então vive aqui agora. Não faço ideia. Olhei-a quando estacionou e desligou o carro e encolhi os ombros quando me olhou.

Deixei então que ela entrasse primeiro e assim que o fez segui-a e fechei a porta atrás de mim, depois de Isles se ter certificado que não estava ali mais ninguém. Deu-me vontade de rir quando ela falou em ir-se embora por causa de baratas mas mantive-me calado. Ia deixar que fosse Isles a falar.

— Eu peço desculpa encontrarmo-nos aqui, mas é mais seguro assim. Sei que não tem bom aspeto, mas eu vou tentar ser rápido para não tomar muito do teu tempo. Eu sei que deves ter imensas dúvidas quanto a tudo, e eu pedi ao Joshua que te trouxesse aqui para isso mesmo. Podes perguntar o que quiseres e eu irei explicar da melhor forma que puder. Há coisas que não posso dizer, como é normal. Eu conheço-te há muito tempo, Cinder. Na verdade eu conhecia o teu pai. Passámos de pacientes a amigos e ele era uma pessoal espetacular, lamento imenso o que aconteceu. Só que... O teu pai a dada altura... — Ele encolheu os ombros e suspirou. — Eu teu pai começou a ter uns problemas. Eu fiquei a saber porque ele contou-me. Eu cheguei a dar-lhe dinheiro para alimentar o vício dele, só que foi piorando. E ele começou a mudar completamente, então deixei de o ajudar. — Olhou-a seriamente, e antes que ela perguntasse algo, ele respondeu e continuou. — Poker. Ele queria experimentar e ao início estava tudo bem mas o teu pai não conseguia parar, Cinder. Eu tentei ajudá-lo, eu deixei de o financiar porque ele estoirava quase todo o dinheiro e a tua mãe só mais tarde é que começou a saber para onde ele ia.. Enfim. O que eu te quero contar, é que o teu pai decidiu endividar-se com quem não devia. Pediu dinheiro a pessoas que nunca devia ter conhecido sequer. Mas ele estava tão desesperado e quis sempre mais que não queria saber. Só quando as coisas começaram a apertar é que ele se apercebeu da porcaria que andava a fazer. Ele recebia ameaças e sabia que a qualquer altura podiam fazer-lhe algo. Só que ele não pensou que fizessem a toda a família. Ele já me tinha pedido para olhar por vocês caso lhe acontecesse algo. Como só sobreviveste tu... Eu tenho tentado seguir-te ao máximo, tenho tentado cumprir o que prometi ao teu pai. E essa gente é muito perigosa, eles estão infiltrados em todos os serviços que possas imaginar, incluindo a polícia. Está tudo alterado porque é assim que querem. Da mesma maneira que o Joshua teve uma perda de memória porque assim lhes apeteceu. — Ele voltou a respirar fundo. — Não peço que confies em mim. Percebo se não o fizeres, Cinder. E mesmo que queiras deixar de me ver ou o que quer que seja, só te peço que tenhas cuidado. Se não me deixares fazer o que o teu pai me pediu, ao menos tem cuidado.

Ele suspirou e levantou as mãos como se se rendesse. — Cinder, eu não ganho absolutamente nada com isto. Se as coisas contadas assim não chegam, eu tenho provas. Eu tenho provas que eu e o teu pai éramos amigos, tenho provas das dívodas dele, as ameaças que ele recebia. Eu tenho isso tudo. Algumas delas estão ali. — Afirmou, apontando para a caixa que eu tinha trazido. — Eu não tenho nada a ganhar com isto, eu não estou a mentir. Mas eu compreendo que não acredites. O teu pai nunca quis contar a nenhum de vocês porque tinha vergonha. Não queria que olhassem para ele cono um falhado, não queria que soubessem que podiam estar em perigo por culpa dele. Ele pediu-me para nunca contar, e só o fazer caso fosse necessário. A tua mãe descobriu pouco antes do acidente mas de resto só eu e ela sabíamos. E eles, claro. Agora... — Suspirou. — Tu fazes o que quiseres. Querias respostas, já as tens. Não te vou obrigar a nada. Eu não preciso que pagues sequer, se não me quiseres ver mais, tudo bem. A escolha é tua, podes sair quando quiseres.

Fiquei ligeiramente assustado e segurei melhor a caixa, mas depois dei-lha. Se era para isto que ela cá tinha vindo e se era para isto que eu trouxe aquilo, então que fosse. Fiquei então depois a um canto, olhando para um e para o outro, perdido.

Isles ergueu o sobrolho e suspirou. — Não precisas de fazer esse aparato todo porque ninguém te está a impedir de nada. Aliás, até te estamos a dar as coisas. Tem aí a maior parte. Fotos e esse tipo de coisas. As provas das dívidas eu não pude deixar com o Joshua por serem coisas mais sérias, por isso tenho-as guardadas num sítio seguro. Mas posso mostrar-tas também, se assim o quiseres.

Isles pegou num envelope dos grandes que continha fotocópias das dívidas e ameças e mandou-o para cima da cama. — Cinder, acalma-te. — Avisou o médico já com um ar sério e pouco paciente.
Mas assim que eu comecei a ouvi-la a falar mais devagar, entendique alho não estava certo. Estava a aproximar-me dela quando o seu corpo começou a perder as forças e a cair. Felizmente fui a tempo e segurei-a durante a queda. Puxei-a e agarrei o seu corpo com um dos braços, e com a outra mão dei-lhe leves palmadas. Suspirei quando comecei a ouvir Isles sobre ela ser fraca demaos para ouvir as verdades.
— Pára, ok? Já pensaste como seria se fosse ao contrátio? Se fossemos nós no lugar dela? Devias ir com calma, pensei que era isso que tinhas dito ao telemóvel! Ela não é fraca, é simplesmente muita coisa para digerir. Era o pai dela, caramba. Se até eu que ando a recuperar as ideias ando confuso como a merda imagina ela agora! — Aproveitei para falar enquanto ela ainda parecia adormecida nos meus braços e depois peguei nela e deitei-a na cama. Tirei-lhe a chave do carro, meti tudo de volta na caixa, levando isso e o envelope para o carro. Uma vez aberto, voltei ao quarto e peguei nela, levando-a para o carro. — Não quero saber. Ela detesta hospitais e de certeza que não é boa ideia lá ires e dizeres o porquê de isto lhe ter acontecido. — Suspirei e coloquei o gps a trabalhar e sem ligar a mais nada do que o Isles dizia, conduzi da melhor maneira que pude de volta a casa.
Lá, repeti o processo de a levar ao colo e depois regressar para ir buscar a caixa e o envelope. Assim que estava pronto, comecei a mexer-me de maneira quase automática. Verificava as pupilas, a respiração, a temperatura... Tudo.